quinta-feira, 21 de maio de 2009

Anjo Rubro

Camila gostava de botas velhas e sujas, amava o cheiro do campo e seus cabelos desgrenhados. Era uma menina feliz, como todos diziam ser, afinal, estava sempre com um sorriso de fuligem no rosto.
Todos os dias, saía para as roças de manhã cedo para colher as frutas em seus jardins de matas. Cantarolando sempre ia, a paquerar os pássaros e sentir a aurora em seu rosto tatuado de poás rubros; subia no telhado para convidar o céu a lhe engolir. Claro, era um anjo sem asas.
Um dia qualquer, Camila caiu do telhado em cima das palhas e de um velho criado que nunca havia lhe chamado a atenção. Arrastou-se pelas telhas e calhas e as pedras que formavam o muramento da casa, ao passo que seu sangue misturava-se com a cor de seus cabelos. Percebe-se então envolta por uma corda em sua cintura. Alguém a laçara. De anjo para uma vaca, o que parecia.
Antônio berrava para toda a gente ouvir “Lacei o anjo, peguei o anjo! Agora ele é todo meu!”.
Levou-a para o estábulo e deu-lhe um vestido branco e maltrapilho de flanela, acompanhado de uma coleção de borboletas que o enfeitava. Ele mesmo preparou, como um bom sonhador. O sonho? Fazer também parte do céu, e para isso queria então torna-se uma só carne com aquele ruivo anjo, Camila.
Levou-a a freguesia da cidade, subornou o vigário e então se casou. Seu rosto reluzia refletido nas lágrimas dela e seu sorriso mal o deixava enxergar a injustiça que cometera.
Camila não era um anjo, e isso ele só descobriria à noite...
PS: Finalmente atualizei!

Nenhum comentário:

Postar um comentário